Há um psicólogo novo! Ou é só um Chat/Robot
Quando os chats substituem psicólogos, a saúde mental transforma-se numa mercadoria e o verdadeiro cuidado desaparece no vazio das máquinas.
Confiar a saúde da mente a um chat com emojis não é apenas um risco tecnológico é uma rendição perigosa à frieza da era digital. A promessa de soluções rápidas pode camuflar a complexidade do que sentimos e o cuidado profundo que merecemos. A saúde mental não é código, nem apenas um serviço disponível 24hora e 7 dias por semana sem rosto. É um espaço de encontro, vulnerabilidade e transformação, que exige presença, empatia e tempo.
Aplicações e algoritmos prometem cuidar da sua saúde mental sem intervenção humana, mas especialistas alertam: esta revolução tecnológica pode tornar-se numa armadilha. Diagnósticos errados, interpretações falhadas das emoções e exposição de dados íntimos são apenas o início. O futuro próximo esconde um cenário em que a inteligência artificial deixa de ser mero instrumento e pode, em nome da eficiência, manipular e substituir o psicólogo humano, ameaçando a privacidade e a segurança emocional de cada um.
Hoje, até a ansiedade pode ser “ouvida” por um chat. Estas aplicações, vendidas como psicólogos de bolso, respondem em janelas coloridas e instantâneas. Mas será que deslizar os dedos no ecrã e receber respostas pré-definidas chega sequer perto da empatia de um terapeuta de carne e osso?
Sim, a tecnologia tornou acessível o que antes era impensável para quem vive isolado ou teme o estigma. Porém, trocar o encontro humano pela ilusão da rapidez digital coloca-nos num risco silencioso: diagnósticos errados, respostas mecânicas e a incapacidade flagrante de compreender emoções complexas podem não só falhar — como agravar o sofrimento.
A ironia cruel é que muitos fogem para as soluções digitais porque o Estado não responde em tempo útil à angústia de quem pede ajuda e quem espera semanas ou meses por uma consulta acaba por aceitar atalhos digitais. Pouco se fala, contudo, da irresponsabilidade de um sistema onde até os seguros de saúde subestimam o papel dos psicólogos, muitas vezes excluindo-os das coberturas ou impondo limitações que fazem do apoio real uma miragem. Entre burocracias e desvalorização, o psicólogo segue à margem, como se cuidar da mente fosse um luxo descartável.
Privacidade? Uma miragem ainda maior. Quem pode afirmar que as confidências entregues a estas plataformas não serão vendidas, cruzadas ou manipuladas por interesses alheios? Numa era em que se lucram milhões com dados pessoais, a saúde mental é apenas mais um negócio disfarçado de promessa de bem-estar.
Na prática clínica, assisto cada vez mais a quem chega desiludido, depois de confiar em chats automáticos e descobrir que frases feitas e algoritmos não oferecem mais do que um alívio rápido e, no fundo, vazio. Falta o olhar, a escuta, o espaço seguro de quem compreende silêncios e subtilezas, tudo aquilo que máquina nenhuma chega sequer a imaginar.
A verdade é que terapia não são respostas bonitas dadas por um robo, mas sim uma relação viva, um espaço único de transformação guiado pela sensibilidade profissional e pelo encontro verdadeiro. Sem isso, confundimos atalho com cuidado e sobrevivência com cura.
Enquanto persistir a ideia de que a saúde mental pode ser reduzida a uma troca de mensagens sem alma, estaremos a perpetuar a invisibilidade do psicólogo e a alimentar uma política que valoriza tudo menos o essencial: o respeito pelo sofrimento e o direito à transformação cuidada de cada pessoa.
Antes de entregarmos as nossas emoções a máquinas frias, repensemos: ninguém se cura ou cresce sozinho, nem ao ritmo apressado dos algoritmos. A nossa mente merece mais do que alternativas digitais duvidosas — merece compromisso, humanidade e o valor devido a quem faz da escuta, da reflexão e do respeito a sua vocação.